Nunca se viu numa eleição brasileira, nem mesmo nas eleições feitas durante o AI-5, atos de ditadura como os que estão sendo praticados neste momento pelo Poder Judiciário
(J.R. Guzzo, publicado no jornal Gazeta do Povo em 20 de outubro de 2022)
A censura é um câncer e, sendo câncer, pode gerar metástase — a infecção sai do lugar onde começou e começa a invadir, passo por passo, o organismo inteiro. É o que está acontecendo com os atos de repressão do ministro Alexandre de Moraes e seus imitadores no Tribunal Superior Eleitoral contra órgãos de imprensa. Dia após dia, violam de maneira cada vez mais maligna a liberdade de expressão, estabelecida com palavras indiscutíveis na Constituição Federal do Brasil — e proíbem os veículos de comunicação de publicarem qualquer coisa que o ex-presidente Lula, candidato nas eleições do dia 30 de outubro, não quer que seja publicada. A primeira agressão foi contra a Gazeta do Povo, censurada pelo TSE por informar, com base em fatos escandalosamente públicos, que Lula e o ditador da Nicarágua, Daniel Ortega, são aliados políticos e admiradores um do outro. Lula acha que isso pode lhe custar votos. Exigiu então que a Gazeta não publicasse nada a esse respeito e foi atendido na hora pelo TSE; sempre é. A partir daí o câncer se espalhou. Acaba de infectar a rádio Jovem Pan, e pelos mesmos motivos: levar ao ar notícias sobre fatos verdadeiros cuja divulgação Lula não admite. A rádio está censurada pelo TSE por falar dos processos e das condenações de Lula por corrupção e lavagem de dinheiro. É como se não tivesse existido a Lava Jato, ou a sua prisão durante 20 meses em Curitiba, ou a devolução em massa de dinheiro roubado. A Jovem Pan não pode falar nada disso.
Nunca se viu numa eleição brasileira, nem mesmo nas eleições consentidas e bem-comportadas feitas durante o AI-5, atos de ditadura como os que estão sendo praticados neste momento pelo alto Poder Judiciário. O processo eleitoral, por conta disso, está irremediavelmente sujo; qualquer que seja o resultado, a dupla STF-TSE conduziu durante toda a campanha um processo de destruição da democracia que não pode mais ser consertado. A autoridade eleitoral abandonou, sem maiores preocupações com aparências, a sua obrigação elementar de ser imparcial — está agindo abertamente a favor de um candidato, o ex-presidente Lula, contra o candidato adversário, o presidente Jair Bolsonaro. Montou-se, aliás, com a colaboração da maior parte da mídia, uma colossal operação de fingimento, através da qual STF-TSE pretendem salvar o Brasil do “autoritarismo” — e se servem desta mentira para violar a Constituição, liquidar liberdades públicas e individuais, e impor a censura em favor do seu candidato.
A metástase transbordou do seu foco inicial não apenas quanto aos órgãos de imprensa perseguidos pelo TSE, mas também em relação aos assuntos censurados. Alexandre de Moraes e seus associados no TSE proíbem a exibição de vídeos em que Lula diz “ainda bem” que “a natureza” nos mandou a covid – assim as pessoas aprendem a “importância do Estado”. É proibido dizer que Lula foi o mais votado nas penitenciárias. Também não pode dizer que o PT votou contra, na prática, o Auxílio Brasil proposto no Congresso pelo governo — o partido negou o pagamento parcelado dos precatórios, ou dívidas da União não pagas, e é daí que vem o dinheiro para pagar o auxílio. Nem o ex-ministro Marco Aurélio, do próprio Supremo, pode falar. Os ex-colegas proibiram que ele diga que Lula não foi absolvido, em nenhum momento, pelo STF — apenas teve os seus processos penais “anulados”, sem qualquer menção a provas ou fatos, o que não tem absolutamente nada a ver com “absolvição”. É, em todo o caso, uma interpretação dele como jurista, absolutamente legítima e legal. Mas o ex-ministro foi proibido de falar. E por aí se vai, com multas de R$ 25 mil reais por dia para veículos de imprensa ou para jornalistas que não obedecerem de imediato as ordens da censura — um abuso sem precedentes na história da Justiça brasileira.
Nenhum dos atos de censura do TSE, pelo que ficou provado nas suas decisões, proibiu a publicação de notícia falsa — como, hipocritamente, Moraes e colegas vêm dizendo que era a sua intenção, antes ainda da campanha eleitoral começar. Agora se vê que só foi proibida, como sempre quiseram eles, a publicação de informações verdadeiras. Estas sim, são e sempre foram o objetivo real da repressão ditatorial mais flagrante que o país já viu desde a abolição do AI-5. A ditadura do Judiciário está proibindo dizer a verdade no Brasil.
REVISTA OESTE