Ponto de vista: Permissividade penal e criminalidade

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Por Joaci Góes

Ao querido amigo e mestre Thomas Bacellar! 

A relação entre a permissividade penal e elevadas taxas de delinquência é linear. Examinemos o caso do Brasil, em geral, e o da Bahia, em particular, para demonstrar a tese.  

Com cerca de setecentos mil presos, em 2020, a população carcerária brasileira, na atualidade, caiu, aproximadamente, para 620 mil, na esteira da interpretação equivocada do então Ministro do STF, Ricardo Lewandowski, segundo quem a criminalidade no Brasil era agravada pelo “excesso” de punibilidade, como atestado por nossa “exagerada” população carcerária. O simpático ministro, como se sabe, o que tem de bom, como cultor da gratidão, pelo modo exuberante com que pagava favores com a toga, possuía, como ponto fraco de sua formação intelectual, a quase nenhuma intimidade com a ciência de Pitágoras, característica que o levou, de boa-fé, a defender a libertação dos que considerava “praticantes de delitos menor gravidade”, como meio de reduzir a criminalidade galopante brasileira. A Bahia, também, seguiu o equivocado conselho e reduziu sua população carcerária de 17 para 15 mil detentos, no mesmo período.  

Em números absolutos e relativos, os americanos possuem a maior população carcerária do Mundo, com 2.3 milhões de presos, correspondentes a mais de 700 presos por cada grupo de 100 mil habitantes. Se o Brasil copiasse o modelo americano, nossa população carcerária deveria ser da ordem de 1.550.000, presos, quase um milhão a mais do que a que possuímos. Como a delinquência no Brasil, contra o patrimônio e contra a vida, é muito maior do que a norte-americana, temos aí a demonstração cabal e inequívoca de nossa leniência sesquipedal no enfrentamento dos crimes de qualquer natureza, com destaque para os do “colarinho branco” que já conquistaram ominosa alforria. 

Esse sombrio panorama é ainda mais agravado na Bahia, onde a delinquência contra o patrimônio e contra a vida é sensivelmente maior do que a média nacional. Os 15 milhões de baianos representam 7,5% do total da população brasileira, implicando que, para ficar na média aritmética, a população carcerária da Bahia deveria ser de 46.500 detentos, e não, apenas, os 15 mil atuais. Os números revelam, portanto, que temos, na Boa Terra, no mínimo, 41.500 marginais saqueando e matando de um modo que sacrifica nossa paz social. Não há aparelho policial que vença essa situação pantanosa, produto de nossa leniência penal. 

Na sequência do fim do Império Romano, os soldados despedidos se organizaram em milícias dedicadas ao crime, a tal ponto que prosperou a crença de que cada indivíduo, para se sentir seguro, deveria ter, permanentemente, um guarda ao seu lado, proposta que levou o poeta Juvenal a indagar: “E quem montará guarda aos guardas?” (Quis custodiet ipsos custodes?) 

Desgraçadamente, esse inquietante panorama consome largo tempo para ser modificado, uma vez que, como sabem as pessoas minimamente inteligentes, a única solução, como já encontrada pelos povos civilizados que não param de fechar presídios, reside no acesso universal a educação de qualidade, percepção que passa longe do alcance da esmagadora maioria de nossos políticos que atuam de olho nas próximas eleições, em lugar de agir inspirados pelas próximas gerações, postura que conduz à continuidade de propostas e ações estruturadas para satisfazer os apetites inferiores da patuleia ignara, vitimada pela ´síndrome de Estocolmo`. O panorama é ainda mais agravado quando assistimos, impotentes, tribunais superiores comandarem a garantia da impunidade para os mais graves crimes praticados contra os interesses da República, reservado o encarceramento para pretos, pobres e putas. 

Sem dúvida, Joseph De Maîstre(1753-1821) teve razão ao dizer, em 1811, que “Toda nação tem o governo que merece!” (Toute nation a le gouvernement qu´elle mérite). 

Joaci Góes

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