Sempre há pessoas dispostas a submeter seu nome a serviço de narrativas que convencem leitores de manchete. Você é um deles?
Nunca imaginei que viveria para ler isto: “Lula acertou sobre o BNDES, apesar de ter errado”. Obrigado, Folha e UOL, por mostrarem que é possível fazer gol, apesar de chutar pra fora, ser inocente, apesar de ter roubado e cantar bem, apesar de desafinar do começo ao fim.
Esse tipo de joguinho de palavras: “Lula acertou”, só funciona com leitores de manchete desatentos, ansiosos e de juízo precipitado, o que, de acordo com as estatísticas, são características bem comuns atualmente. Os cérebros que não memorizam mais nada (porque “não precisa”, qualquer coisa é só consultar o Google) registram apenas isso: Lula acertou.
Mas, se acontecer de algum leitor ligar o cérebro, será preciso desconstruir seu raciocínio e conduzi-lo ao mundo da fantasia, pois é somente lá que há sentido em acertar quando se está completamente errado. Então, para ganhar o leitor que ousa não concordar logo de cara, vem o contraponto: “apesar de ter errado”. E vai que o tal do leitor está a fim de dar trabalho e resolve ler o subtítulo? Nesse caso é preciso dar a sentença definitiva: “Banco deve apoiar o desenvolvimento sustentável de países terceiros”. DEVE APOIAR, entendeu? Fim de papo!
Não importa que sejamos um país subdesenvolvido, que metade dos brasileiros não tenham nem sequer saneamento básico e que, segundo o próprio Lula, haja 33 milhões de pessoas passando fome. O BNDES “deve apoiar o desenvolvimento sustentável de países terceiros”, afinal de contas, como vamos continuar sendo o país de terceiro mundo que temos sido há séculos? Precisamos manter a tradição, não é mesmo?
Mas se o leitor estiver mesmo a fim de encher a paciência e teimar em seguir com a leitura em vez de ir fritar o cérebro do TikTok, aí sim, será preciso qualificar o autor do texto de uma forma tão divinal que ninguém se ache digno de discutir: “nomeado Young Global Leader pelo Fórum Econômico Mundial”. Uau… Um currículo em inglês concedido por uma entidade criada por bilionários que nunca foram eleitos por ninguém, mas que se reúnem para decidir os caminhos que o mundo irá tomar! Nossa, mas que incrível! Devemos nos curvar a tudo o que ele diz!
Finalmente no texto, o autor aponta cinco erros crassos que Lula cometeu, mas vai amenizando um a um para, ao fim do artigo, dizer que o que importa não são seus inúmeros erros, mas sim, o “acerto” de doar o dinheiro dos nossos impostos para outros países. Sim, doar! Até porque, se esses países já provaram que são caloteiros e mesmo assim continuarão recebendo mais grana ainda, que razão eles teriam de pagar futuramente o que receberão agora?
Se você concorda, caro leitor, faça o mesmo. Empreste o seu dinheiro para aquele cunhado que já lhe deve uma bolada, mas sempre tem uma boa desculpa na ponta da língua para não lhe pagar. Ele é tão bacana, né? Não custa nada tirar da boca dos seus filhos para alimentar os caprichos dele. Continue sendo o otário preferido do seu cunhado espertalhão ele vai lhe amar para sempre. Afinal de contas, o que importa é isso: o amor vencer!
R7