Juízes de verdade não participam de comícios como a visita do grupo de advogados; só falam nos autos, e não se reúnem com uma das partes da causa que está sob a sua apreciação judicial
(J.R. Guzzo, publicado no jornal O Estado de S. Paulo em 27 de julho de 2022)
O ministro Edson Fachin, do STF, ocupa neste momento o cargo de presidente do TSE, o serviço que controla as eleições e a contagem de votos no Brasil — uma função que exige a mais óbvia imparcialidade por parte de quem a exerce, sobretudo em momentos, como hoje, em que há uma discussão pública e esquentada sobre a segurança do sistema eleitoral brasileiro. Não é suficiente, aí, a conduta correta: os eleitores terão de acreditar, com 100% de certeza, que ela é realmente correta, e que os árbitros do jogo não favorecem, nem hostilizam, nenhum dos lados que estão em campo. Eis aí o começo, o meio e o fim do problema que existe com o ministro Fachin: ele faz, com os seus atos de função, o maior esforço possível para dar a impressão de que não é imparcial.
Fachin foi advogado do MST, uma organização extremista de esquerda que defende abertamente a prática de crimes — invasão de propriedade, violência física contra pessoas, destruição de bens e outros tantos. Foi militante da campanha eleitoral de Dilma Rousseff, de quem recebeu sua cadeira no STF. Tomou uma das mais extravagantes decisões da história da Justiça brasileira — ao anular, sem nenhuma menção a provas ou à culpa do réu, as quatro ações penais contra o ex-presidente Lula, inclusive a sua condenação pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, em três instâncias e por nove magistrados diferentes. Foi essa decisão, e unicamente ela, que tornou possível a candidatura de Lula nestas eleições.
Com uma folha dessas, na verdade, Fachin deveria estar fazendo um duplo esforço par mostrar ao público que as suas inclinações políticas não terão nada a ver com a sua atuação nas eleições de outubro próximo. Mas ele está fazendo o exato contrário disso. Faz um duplo esforço, sim — só que esse esforço é para levar as pessoas a acreditarem que está apoiando Lula. Seu último manifesto de campanha foi receber em seu gabinete membros do grupo de advogados “Prerrogativas”, que milita ativamente a favor da candidatura do ex-presidente, com declarações públicas e dinheiro; já fizeram festa para ele, e um dos seus integrantes mais destacados é o autor da doutrina segundo a qual não vale a pena punir crimes que “já foram” cometidos. Ele se referia, ao enunciar esse princípio, aos crimes de Lula.
O ministro, na fala que fez a receber os advogados, disse que o TSE não vai tolerar o “negacionismo eleitoral”; como o único negacionista que há no Brasil, segundo a pregação maciça dos seus adversários, é o presidente da República, ficou claro de que lado está o chefe atual do TSE na campanha pela presidência. Fachin disse que não se abala diante das “ameaças e intimidações” e declarou ser um “juiz”. Juízes de verdade não participam de comícios como a visita do grupo de advogados; só falam nos autos, e não se reúnem com uma das partes da causa que está sob a sua apreciação judicial. É o oposto do que o ministro está fazendo.
REVISTA OESTE