Conheça a história do turista que ficou meses em prisão do Irã

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“Um sofrimento que é de outro planeta”, desabafou Santiago Cogedor

Retorno de Santiago a Madri Foto: EFE/Borja Sánchez Trillo

 

Um homem inocente que teve de passar 15 meses trancado na prisão mais temida do Irã. Essa é a história do espanhol Santiago Sánchez Cogedor, que apesar de já se encontrar de volta ao seu país natal, ainda tem sua mente cativa no sofrimento que viveu na prisão de Evin. Em entrevista à BBC News, Santiago, de 42 anos, explicou como acabou confinado em um lugar onde “não existem direitos humanos”.

Ele relata que sempre apreciou aventuras, mas que em 2018 começou a viajar por países a fim de desbravar diferentes territórios e culturas. No início, sua experiência como mochileiro deu certo. Ele colecionou boas memórias na América do Sul, incluindo o Brasil, e seguiu para outras partes do mundo, chegando a visitar 15 países em apenas quatro meses.

– Eu tinha proposto uma jornada espiritual, solidária comigo mesmo e com o mundo. Eu estava coletando lixo, plantando árvores e me fantasiando de palhaço em hospitais para crianças com câncer e outras doenças – descreveu.

Entretanto, a visita ao Oriente Médio não saiu como o esperado. Santiago explicou que já havia ido ao Irã, em 2020, e teve uma boa experiência, sentindo-se “fascinado pela hospitalidade” dos habitantes locais.

Quando o viajante retornou ao país, contudo, o cenário estava bem diferente da primeira vez. O caso da jovem de 22 anos Mahsa Amin em setembro de 2022 – morta pela polícia da moralidade islâmica por supostamente não ter usado lenço na cabeça – fez eclodir muitos protestos na nação.

Santiago disse que chegou a ouvir falar da situação, mas não imaginava que “havia violência”. Ao chegar ao país, contudo, o turista foi vítima de uma armadilha.

Na ocasião, um homem que já o havia acolhido em sua primeira viagem ao Irã ofereceu sua hospitalidade novamente ao saber que ele estava retornando ao país. O anfitrião chegou a propor ir buscá-lo na fronteira com o Iraque.

– Fiquei desconfiado quando ele disse isso, porque ele mora a cerca de 1,7 mil quilômetros da fronteira, onde eu estava. Eu falei para ele: “Ei, amigo, por que você tem tanto interesse em vir me buscar? Estou muito longe, né?”. Agora, pensando bem, entendo o motivo. Após a prisão de Mahsa Amini, ele me incentivou a postar algo no Instagram com a hashtag #MahsaAmini e eu sempre ignorei suas sugestões, porque não estava interessado – acrescentou Santiago.

No entanto, no caminho até Teerã, o iraniano fez um desvio e o levou para o túmulo de Mahsa Amini.

– Hoje eu sei que tudo o que ele queria era que eu tirasse uma foto e postasse no Instagram – refletiu.

ACUSADO DE ESPIONAGEM
Tudo saiu de controle quando agentes dos serviços de inteligência iranianos abordaram o turista e encontraram a foto em seu celular. Eles tomaram seus pertences, o vendaram e o levaram para a delegacia, onde Santiago teve que passar 42 dias sozinho em uma cela pequena e ser submetido a interrogatórios constantes.

– Acho que eles sabiam que eu não era um espião, mas continuaram me interrogando – disse.

Contudo, o sofrimento estava apenas começando. Na sequência, o turista foi levado para uma prisão, em Saqqez, e posteriormente encaminhado ao centro de detenção mais temido do Irã: a prisão de Evin, alvo de inúmeras denúncias de violação aos direitos humanos.

A prisão instituída no ano de 1971 atualmente recebe em sua maioria estrangeiros, jornalistas e presos políticos. Em 2021, hackers divulgaram vídeos de espancamentos de detentos no local.

Santiago afirma que, a princípio, teve de permanecer no confinamento solitário por 42 dias.

– Foi muito difícil. É algo que não desejo ao meu pior inimigo. O Irã tirou a minha liberdade, mas me deu tempo para fazer uma viagem dentro de mim mesmo, na qual visitei lugares sombrios e tentei crescer como ser humano – descreveu.

O Setor 209 é, segundo ele, um dos locais mais “horríveis” em que já esteve. Lá, os presos permanecem em uma cela sem banheiros e só são retirados uma vez por semana para ficar por dez minutos em um pátio.

– Aquela parte de Evin gera um sofrimento que é de outro planeta. Eu até conversei com as formigas de lá, mas esse sofrimento é meu. Só sei que sou inocente e passei 15 meses trancado numa prisão onde não existem direitos humanos. Foram 15 meses de pressão sob [a ameaça de] uma possível pena de prisão perpétua ou de morte, porque espiões poderiam ser enforcados no Irã – acrescentou.

Posteriormente, no entanto, ele obteve contato com outros presos e pôde ser voluntário no local, dando aulas de espanhol e ajudando os detentos a praticarem esportes como boxe, futebol e vôlei.

– Os prisioneiros de Evin tornaram-se minha família. Eles me tratavam como um convidado. Eles tinham muito sofrimento e dor, mas também muita hospitalidade.

Santiago só veio a ser liberto no início de 2024, chegando ao Aeroporto de Madri sob muitos aplausos e comoção no dia 2 de janeiro. Até hoje ele sequer sabe o motivo que o levou a ser solto.

Atualmente ele destaca a sorte de ter nascido na Espanha e poder simplesmente andar livremente. Apesar de estar em segurança em seu país, Santiago tem uma caminhada árdua para se recuperar psicologicamente.

– Meu corpo está na Espanha, mas a minha mente ainda está no Irã – desabafou.

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