Capítulo 119 do Caso Faroeste: A segunda parte do pedido da PGR ao STJ para manter afastada a ex-chefe do MPBA; MPF acusa Ediene Lousado de ter vazado a Operação Leopoldo

Destaque
Trechos do documento que fundamenta o pedido da PGR pela manutenção do afastamento de Ediene Santos Lousado, ex-chefe do Ministério Público da Bahia.

O Capítulo 118 do Caso Faroeste abordou parte do requerimento da Procuradoria Geral da República (PGR) encaminhado ao ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Og Fernandes, no qual apresenta o pedido de manutenção do afastamento de Ediene Santos Lousado da função de promotora de Justiça.

O documento é assinado pela Vice-Procuradora-Geral da República, Lindôra Maria Araújo, e data de 7 de dezembro de 2022. Nele consta a seguinte identificação: Nº 1217 PGR/2022/AJCRIMSTJ/PGR/LMA, referente a Ação Penal (APN) n° 1025/DF (2021/0210809-0).

Ediene Lousado atuou, entre março de 2016 e março de 2020, como chefe do Ministério Público da Bahia (MPBA).

A investigação liderada pelo Ministério Público Federal (MPF) surgiu a partir de desdobramentos do conflito judicial entre José Valter Dias, autor da Ação de Reintegração de Posse de nº 0000157-61.1990.8.05.0081, contra os acionados Grupo Econômico dos Okamoto e Grupo Bom Jesus Agropecuária, e contra o terceiro interessado, advogado Domingos Bispo.

Cronologia dos fatos

Em 14 de dezembro de 2020, a PF deflagrou a 6ª e 7ª fases da Operação Faroeste que objetivou apurar, em tese, a prática dos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, numa dinâmica organizada, em que gravitam 4 núcleos de investigados:

  1. a) Núcleo Judicial, onde operam desembargadores, magistrados e servidores do Tribunal de Justiça da Bahia,
  2. b) Núcleo Causídico, que tem advogados fazendo a intermediação entre os julgadores e produtores rurais,
  3. c) Núcleo Econômico, que conta com produtores rurais, todos com a deliberada intenção de negociar decisões, em especial, para legitimação de terras no oeste da Bahia, não se perdendo de vista a descoberta posterior do
  4. d) Núcleo de Defesa social, cuja provável missão era dar blindagem aos demais núcleos, tendo, em sua composição a então Procuradora-Geral de Justiça do Ministério Público da Bahia (MPBA), Ediene Santos Lousado; e outros.

Quando a ação ostensiva foi deflagrada pela Polícia Federal, a promotora de Justiça era Conselheira Substituta no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), ao passo em que tinha sido aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal para o cargo de efetiva, com mandato de dois anos.

Em 7 de dezembro de 2020, no bojo da denominada Operação Faroeste, foi determinado o afastamento cautelar de Ediene Santos Lousado do exercício da função de Promotora de Justiça do Ministério Público da Bahia, pelo prazo de um ano. Mas isso ocorreu apenas uma semana depois de dada a ordem judicial.

Em 26 de fevereiro de 2021 e 15 de fevereiro de 2022, a Corte Especial do STJ renovou a ordem de afastamento.

Capítulo 119 do Caso Faroeste: A segunda parte dos argumentos da PGR para manter afastada a ex-chefe do MPBA

Contendo 16 páginas, o Jornal Grande Bahia (JGB) expõe a segunda parte do requerimento da PGR que convenceu os ministros da Corte Especial do STJ da necessidade de manter afastada Ediene Santos Lousado da função de Promotora de Justiça. O referido documento foi enviado por fonte ao veículo de imprensa.

 — O afastamento cautelar de Ediene Santos Lousado encontra substrato no risco para coleta da prova e o normal desenvolvimento do processo, em especial pelo descaso com o Sistema de Justiça, numa dinâmica em que ela monitorava e perseguia o membro auxiliar da Procuradoria-Geral da República, usando o múnus ministerial para fins ilícitos e particulares.

— Repise-se, por essencial, que a presente medida teve sua necessidade reforçada quando estampados os elementos probatórios do Relatório de Análise de Material Aprendido nº 175 – INQ 12589, referente ao aparelho telefônico de EDIENE SANTOS LOUSADO, o qual demonstrou que a ex-Procuradora-Geral de Justiça buscava a todo instante monitorar e impedir as investigações.

— Na oportunidade, foi apresentada conversa entre Ediene Santos Lousado e Gabriela Macedo, plenificando a relação direta de ambas com Adailton Maturino e Geciane Maturino, integrantes da organização criminosa sindicada, quando, em 05/08/2016, aproximadamente 20 dias antes da deflagração das Operações Immobilis e Oeste Legal, Ediene encaminha mensagem para Gabriela repassando informações, em tese, sigilosas, relatando que o GAECO/BA não possuiria nenhuma investigação em face da sociedade empresária Rede Blindada De Segurança.

— Ato contínuo, Gabriela Macedo encaminhou mensagem para Ediene Lousado com o nome completo de Geciane Maturino e o seu número de inscrição no Cadastro de Pessoa Física, buscando informações sobre esta última. Depois, Gabriela Macedo informou que precisava atualizar Ediene Lousado sobre a operação que aconteceria no oeste baiano.

— Mas não é só. Ediene Santos Lousado repassou para Gabriela Macedo informação de interceptação telefônica em andamento, relatando que Adailton Maturino estaria sendo interceptado e Geciane Maturino não, mobilizando-se para perturbar e impedir a produção de provas, objetivando interferir na busca da verdade na apuração criminal existente no INQ nº 1258/DF.

— Como forma de blindar seus demais comparsas, Ediene Santos Lousado vazou a denúncia (encaminhou o arquivo em .pdf) da Operação Leopoldo [1] no dia 12 de junho de 2017 para Gabriela Macedo, bem como assentou que Maurício Barbosa e o seu Superintendente de Inteligência Rogério Magno não precisariam se preocupar, posto que havia um pedido de diligência na denúncia para que houvesse remessa dos autos para ela, então Procuradora-Geral de Justiça.

— Restou desnudado, ainda, que na véspera da deflagração das Operações Oeste Legal e Immobilis, Ediene Santos Lousado, em diálogo mantido com o então coordenador do GAECO/BA, Luciano Taques, enviou o release da notícia que seria divulgada pelo Tribunal de Justiça da Bahia referente à medida ostensiva que seria realizada, a esboçar que possuía duas preocupações centrais: o avanço da Operação Faroeste e o monitoramento da atividade funcional do Promotor de Justiça João Paulo Schoucair, cedido para atuar como membro auxiliar do Procurador-Geral da República nos casos envolvendo ações penais originárias no Superior Tribunal de Justiça.

— Tal situação tonifica-se quando Ediene Lousado afirma, em suas mensagens, que estava acompanhando de perto o trabalho do referido Promotor, narrando o seguinte nas mensagens: “Quero saber o que Schoucair está colocando nessa investigação contra mim” e “Já tenho informação segura que João Paulo está trabalhando na Faroeste”.

— Relembre-se, ainda, que a conversa assume contornos de maior gravidade quando EDIENE SANTOS LOUSADO confessa que tentará interferir na investigação, indo diretamente no Superior Tribunal de Justiça, órgão responsável pela Operação Faroeste, em clara e manifesta afronta ao Sistema de Justiça, dizendo:

“Estou pensando em algo para compartilhar com você depois, por isso quero ir ao STJ. Quero me blindar.”, bem como relatando que gente de dentro da Procuradoria-Geral da República a informa.

— Adicione-se, outrossim, que Ediene Santos Lousado assevera que irá buscar afetar a sanidade mental do mencionado Membro Auxiliar, passando a debater qual seria a melhor estratégia criminosa para tanto e a necessidade de falar com o Corregedor Nacional do Ministério Público Rinaldo Reis, usando sua influência para prejudicar aquele que, na sua visão, estaria atuando 200% na Operação Faroeste.

— Dentro dessa óptica, há fartos elementos probatórios que demonstram as atividades de Ediene Santos Lousado, cujo escopo era proteger a organização criminosa de Adailton Maturino, bem como de receber, direta ou indiretamente, vantagens indevidas, em razão da função exercida, numa atuação em que ela procurava ter acesso a informações sigilosas junto ao GAECO/BA, como verdadeira agente infiltrada criminosa.

— Nesse ponto específico, não se pode perder de vista que o poder e influência de Ediene Santos Lousado ficam cristalinos, reforçando a necessidade da presente medida de afastamento, quando a atual Corregedora do Parquet baiano, a Procuradora de Justiça Cleonice de Souza, formula pedido de abertura do processo administrativo ao Conselho Nacional do Ministério Público em seu desfavor, ante a repercussão nacional do caso em tela, cujo desfecho, data máxima vênia, não se tem notícia.

— Tem-se, assim, que os elementos informativos, até então amealhados, no Relatório de Análise de Material Apreendido nº 003/2021 – NA/DELECOR/SR/PF/BA, apontam para a existência de indícios de vazamento de informações sigilosas, atuação do núcleo de defesa social blindando outras situações no oeste baiano, negociações espúrias com a interferência da Ex-PGJ Ediene Santos Lousado na apuração de irregularidades em licitação do TJBA, possível exercício de advocacia administrativa em favor de irmão da Ex-PGJ Ediene Santos Lousado, suposta ligação do ex-SSP Maurício Barbosa com a empresa PROSSEGUR, da ingerência da Ex-PGJ Ediene Santos Lousado junto ao Corregedor Nacional do CNMP e do suposto pagamento de vantagens indevidas pelo advogado Fábio Medina Osório a magistrados, fortificando a necessidade da presente medida cautelar.

— Portanto, existem provas de que a denunciada Ediene Santos Lousado, se envolveu na prática habitual e profissional criminosa, numa formatação serial, estendendo-se por vários anos, em total abalo à ordem pública. Em outras palavras, constata-se, no caso concreto, indícios de reiteração delitiva em um contexto de corrupção sistêmica, o que coloca em risco a ordem pública e em xeque a credibilidade do Poder Judiciário, não se perdendo de foco que o presente caso está apto para ter em breve seu desfecho, numa complexa composição fática que envolve multiplicidade de acusados.

— Diante do exposto, requer o Ministério Público Federal a renovação do afastamento do exercício das funções do cargo de promotora de Justiça, pelo prazo de um ano, sem prejuízo de posterior reavaliação, à denunciada Ediene Santos Lousado, cumulada com a proibição de acesso dos mesmos às dependências do Ministério Público da Bahia, bem como de comunicação com funcionários e de utilização dos serviços de tais Órgãos, nos termos do disposto no art. 319, incisos II, III e VI, do CPP.

Assina o requerimento, em 7 de dezembro de 2022, a Lindôra Maria Araújo, vice-procuradora-geral da República.

Corte Especial do STJ julga manutenção do afastamento

Em 15 de dezembro de 2022, no âmbito da Ação Penal (APn) nº 1025, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu prorrogar por um ano o afastamento da promotora de justiça Ediene Santos Lousado, denunciada no âmbito da Operação Faroeste – deflagrada para apurar esquema de venda de decisões judiciais para a grilagem de terras no Oeste da Bahia.

Ao avaliar a necessidade da manutenção do afastamento, o ministro Og Fernandes destacou que os fatos criminosos ainda não foram julgados pela Corte Especial. Além disso, o relator apontou que os acordos de colaboração premiada firmados na operação resultaram em novos inquéritos e podem originar novas ações penais.

“Esse panorama demonstra que, nada obstante as investigações estejam avançando, não é possível afirmar que a apuração dos graves fatos investigados foi concluída. Logo, não é recomendável permitir que a denunciada reassuma suas atividades no Ministério Público do Estado da Bahia neste momento”, afirmou o magistrado.

No voto proferido, Og Fernandes reiterou o que havia dito na decisão inicial de afastamento da promotora: os delitos investigados estão diretamente ligados ao exercício funcional e teriam sido praticados no desempenho abusivo da função, com graves consequências para a imagem e a credibilidade do Judiciário e do Ministério Público.


[1] A Operação Leopoldo segundo a PGR

“Relembre-se que a Operação Leopoldo foi deflagrada em 04/10/2016, tendo como objetivo desarticular suposto esquema criminoso envolvendo os desembargadores aposentados do Tribunal de Justiça da Bahia, quais sejam, Clésio Carrilho e Daisy Lago, apontados como suspeitos de exigir propina para proferirem decisão favorável em ação de inventário multimilionáriao O grupo de MATURINO tinha interesse nessa operação pelo fato de que um dos líderes da organização, a Desembargadora Maria Do Socorro, integrava a 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Bahia com o então desembargador Clésio Carrilho, podendo este vir a denunciar todo o esquema criminoso, inclusive a aludida magistrada, caso viesse a ser preso.”, informa a PGR no Requerimento Nº 1217 PGR/2022/AJCRIMSTJ/PGR/LMA, referente a Ação Penal (APN) n° 1025/DF (2021/0210809-0).

JORNAL GRANDE BAHIA

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