Como se sabe, Estado é a nação organizada. Antecedendo ao Estado, a nação somos nós, brasileiros; o Estado são os governos que nomeamos em nosso nome e sustentamos com nossos impostos, para prestarem os serviços básicos de justiça, educação, saúde, segurança e saneamento. Escolhemos representantes pelos quais exercemos nosso poder, de origem numa democracia. Chegando ao fim de ano como agora, vem a premência de perguntar, se nossos representantes, nossos mandatários, estão trabalhando “com o povo, pelo povo e para o povo” — ou preferem trabalhar com o Estado, pelo Estado, para o Estado? Seria proveitoso se deputados, senadores e vereadores se perguntassem, em exame de consciência de fim de ano, com quem, para quem e por quem estão trabalhando.
Pensei nisso quando vi a destinação de R$ 4,9 bilhões de impostos para o fundo partidário no ano das eleições municipais. A verba anterior era de 900 milhões. Por que o meu imposto tem que ir para partidos com os quais não concordo? Por que os partidos não são sustentados apenas por seus filiados? É um dinheiro gasto sem retorno. Num país em que metade da população não tem esgoto e as crianças com doenças causadas por isso ficam sem desenvolvimento do cérebro, alguém pensa nas consequências de imposto mal aplicado? Pensam na nação com QI bem abaixo da média? Pensam no futuro — ou na próxima eleição?
Também pensei se o Estado respeita a nação quando, nesses dias, o Conselho Nacional de Política Energética decidiu adicionar mais óleo vegetal ou animal no diesel, a partir de março. Não perguntou para a nação que usa diesel no agro e nas estradas se concorda ou não. Assim como não perguntaram aos proprietários de motores a gasolina se poderiam adicionar 27% de álcool hidratado. Como todos sabemos, essas adições, que eu chamo de adulterações, entopem o sistema de injeção dos motores, criando borra e, no caso do álcool hidratado, também provocam ferrugem.
Pensei nisso também quando vi uma deputada estadual do Rio de Janeiro ser conhecida como “madrinha” da milícia da Zona Oeste. E sabemos que ela é apenas a ponta de um iceberg. Que grupos econômicos ou criminosos são os verdadeiros mandantes? Mandatários eleitos estão a serviço da nação, ou há interesses superiores aos da nação? Quando a Constituição e o devido processo legal são desprezados e o Senado cala, onde está o juramento de defender a Constituição? O congressista que não zela pela preservação de sua competência legislativa merece ser reeleito? São perguntas dessa época de balanço.
Passamos o ano constatando como o Estado, com seus agentes eleitos ou não, vai se distanciando de seu povo e agindo como se ele, Estado, é que fosse o senhor. Aí, deixa de ser democracia, em que manda é quem está operando o Estado e não a nação. A passividade da nação contribui para isso, por falta de saber como deve funcionar a democracia. O ensino é fraco, porque o conhecimento liberta. Os que ingressam na casta pública criam seus privilégios e se tornam mais iguais que os outros. Esses outros são eleitores, pagadores de impostos e objetos do lindo parágrafo único do primeiro artigo da Constituição que estabelece que “todo poder emana do povo”. Democracia é quando o Estado teme o povo — e não o inverso.