Nota evidencia crise após PF, prender acusados de mandar matar vereadora e motorista, mas cita confiança em esforço conjunto
Sede do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, no centro da cidade. Foto: Fernando Frazão/ ABr
Davi Soares
O Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) publicou nota em que exaltou seu poder de investigação exercido no caso do assassinato da vereadora Marielle Franco e de seu motorista Anderson Gomes, há seis anos. E afirmou que “não medirá esforços para enfrentar as vis tentativas de desqualificar” seu trabalho, ao refutar alegações nascidas do relatório da Polícia Federal (PF) sobre as prisões dos acusados de ser mandantes do crime, no último domingo (24).
A nota evidencia uma crise com a PF, mas cita a confiança em esforço conjunto de todas as esferas estatais, como único caminho para conquistar maior resolutividade nas investigações e na celeridade para a obtenção de respostas para a sociedade.
O MPRJ ressaltou que o trabalho investigativo executado por suas estruturas tem competência reconhecida, e resultou, por exemplo na identificação e prisões dos executores do crime, Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz, pela atuação de seu Grupo de Atuação Especializada de Combate ao Crime Organizado (GAECO/MPRJ).
A fonte de insatisfação da nota tem relação direta com a decisão da PF de expor detalhes de investigações que o MPRJ ainda apurava em sigilo. E de ter sugerido que o órgão ministerial fluminense resistiu à federalização do caso, dificultando seu desfecho, no relatório que a PF divulgou no dia das prisões preventivas do deputado federal Chiquinho Brazão, de seu irmão e conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio, Domingos Brazão, e do delegado da Polícia Civil, Rivaldo Barbosa, todos acusados de serem autores intelectuais do crime.
A PF nega ter exposto dados sigilosos da apuração do MPRJ, e diz ter obtido autorização judicial para divulgar seu relatório.
Leia a íntegra da nota:
O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) vem a público refutar as alegações que têm sido ventiladas a partir do relatório da Polícia Federal sobre as investigações dos assassinatos de Marielle Franco e Anderson Gomes, divulgado no último domingo (24/03), mesma data em que foi deflagrada a operação conjunta Murder, que resultou na prisão dos autores intelectuais dos homicídios da vereadora e de seu motorista.
Inicialmente, cabe destacar que todos os dados preliminares obtidos nas apurações sobre o caso, que resultaram na identificação e prisão dos executores Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz, são frutos do trabalho do Grupo de Atuação Especializada de Combate ao Crime Organizado (GAECO/MPRJ). Todos esses passos iniciais foram concretos, fundamentais e amplamente reconhecidos pela sociedade e familiares de ambas as vítimas, por diversas vezes recebidos pelo procurador-geral de Justiça, Luciano Mattos, e pelos promotores responsáveis pelas investigações.
Importante ressaltar que, em março de 2021, o procurador-geral de Justiça especializou ainda mais o GAECO com a criação da Força-Tarefa Marielle Franco e Anderson Gomes (GAECO/FTMA), destinando a essa estrutura promotores de Justiça e servidores para se debruçarem diuturnamente nas diversas investigações relativas às mortes e crimes a elas conexos.
No curso das investigações sempre foram somados avanços: as denúncias contra Ronnie Lessa por outros crimes, alguns já com condenações; a denúncia contra o PM Rodrigo Jorge Ferreira e a advogada Camila Lima Nogueira, por obstrução de Justiça; a decisão judicial de que os executores sejam julgados por júri popular; a denúncia e prisão do ex-bombeiro Maxwell Simões Correa; a disponibilização de dados telemáticos pelo Google; o acordo com o Facebook para obtenção de informações, com posterior pagamento de multa por seu descumprimento; a denúncia e prisão do dono do ferro-velho que recebeu, desmanchou e descartou o veículo Cobalt utilizado no crime, além das delações de Élcio de Queiroz e Ronnie Lessa, que levaram à identificação dos mandantes.
Importante que, mesmo com a manutenção das investigações do caso na esfera estadual, a partir de decisão unânime junto à 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em maio de 2020, que indeferiu a “federalização” das investigações, foram estabelecidos, pelo MPRJ, diálogos diretos com a esfera federal, em especial com o Ministério da Justiça e a Polícia Federal, com o compartilhamento de informações e adoção de medidas colaborativas, que também resultaram na maior efetividade dos trabalhos. O caso foi remetido ao STJ em setembro de 2023, por ocasião da mudança de entendimento daquela Corte em relação aos crimes cometidos por conselheiros dos Tribunais de Contas.
Merece atenção o fato de que, em paralelo, a investigação do caso Marielle e Anderson desencadeou dezenas de investigações diretas pelo GAECO/MPRJ, de relevante repercussão na sociedade fluminense, a exemplo do desbaratamento da cúpula da Milícia de Rio das Pedras, na conhecida operação Intocáveis; e na identificação do grupo de matadores de aluguel antes nunca investigado, conhecido como Escritório do Crime, além de significativas investigações contra a máfia da contravenção, que levaram à prisão de Rogério de Andrade e Bernardo Bello, entre outros.