Por Joaci Góes
Para a querida amiga e Presidente da AUI Dinara Cavalcanti!
Em apertada síntese, as religiões são um conjunto de crenças e devoções ao que se considera sagrado, através das quais os devotos buscam a ajuda de seus deuses para vencer dificuldades e alcançar a felicidade. Essas crenças e devoções figuram em textos reputados sagrados, como a Bíblia e o Alcorão, para ficarmos nas duas maiores religiões, o Cristianismo, com mais de dois bilhões de seguidores, e o Islamismo, com pouco menos desse número. O Hinduísmo segue em terceiro lugar e, muito abaixo, em quarto, aparece o Budismo, com pouco mais de 50 milhões de fiéis.
Como regra, os fiéis praticam suas crenças em espaços considerados sagrados, sob a regência de um sacerdote. Do ponto de vista laico, as religiões são sistemas culturais de comportamentos e práticas sociais subordinados a visões sobrenaturais, transcendentais ou espirituais e éticas do mundo. Essa complexidade responde pela variedade e elasticidade de sua conceituação. Na invencível dificuldade de conhecer suas origens primeiras, os estudos acadêmicos recorrem à psicologia cognitiva para atribuir à mente o poder de conferir intenção e personalidade aos fenômenos naturais, daí nascendo os primeiros deuses, do mesmo modo como atribuímos intenções a outras pessoas, consoante nosso alvedrio, eventualmente, muito distantes da verdade factual. Achados de restos mortais humanos e artefatos, de 40 mil anos a.C., corroboram essas interpretações, chanceladas por valiosas descobertas de períodos cada vez mais recentes.
Segundo os americanos John Monaghan e Peter Just, expoentes da Antropologia Social e Cultural, algumas das grandes religiões nasceram de movimentos destinados a modificar situações reputadas extremamente ameaçadoras ao bem estar geral, campo fértil para a emergência de visionários ou profetas, valorizados pela insegurança emocional dominante. A afirmação desses gurus, porém, dependeu, sempre, menos de suas virtudes intrínsecas e muito mais do grau de disposição de grupos que apoiaram o seu legado ou propostas. Por tudo isso, o filósofo alemão Ludwig Feuerbach(1804-1872), reconhecido pelo seu ateísmo-humanista que tanto influiu sobre o pensamento de Marx e de Freud, concluiu em sua vasta obra que o homem cria Deus como sua própria imagem aperfeiçoada, sendo a religião um modo de patologia psíquica.
Essa longa introdução vem a propósito da crise, sem precedentes, em que o argentino Papa Francisco, na pia batismal Jorge-Mario Bergoglio, vem mergulhando a Igreja Católica, ao assumir posições que o aproximam de substancial parte do seu rebanho, na mesma intensidade com que deixa na orfandade espiritual outros tantos fiéis, cujo dimensionamento preciso começa a ser objeto de preocupantes aferições. Do ponto de vista histórico, não há precedentes, desde o surgimento do Cristianismo, no Império Romano, de um Papa que tenha tido sua autoridade tão intensamente questionada como a do Papa Francisco, que de uma portentosa unanimidade, entre os fiéis, no início do seu pontificado, ao substituir o renunciante Papa Bento XVI, em março de 2013, vem perdendo prestígio, a ponto de ser apontado, pública e veementemente, como Satanás infiltrado na Igreja para destruí-la. Há quem sustente que o Papa Francisco já superou em impopularidade o Papa Pio XII, cognominado o Papa de Hitler no livro de 1999 do católico americano John Cornwell. Aos que levantam a suspeita de que o Papa Francisco sofre de demência, em razão dos desvios de conduta que vem praticando, ao assumir posições partidárias em questões internas que dividem o seu rebanho, em vários países, sem qualquer base, outros vêm em sua modesta formação acadêmica, detentor, apenas, de um diploma técnico em Química Industrial, a razão de suas dificuldades para interpretar a complexidade do mundo moderno, ao condenar a riqueza e exaltar a pobreza, como virtude, base da tese de Max Weber, no livro de 1904, A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, segundo a qual a razão da maior prosperidade dos países protestantes, comparativamente aos países católicos, residiria na exaltação da riqueza, pelos primeiros, e da pobreza, pelos últimos, como presente no famoso aforismo “É mais fácil um camelo passar no buraco de uma agulha do que um rico ganhar o Reino dos Céus”.
Tem razão Immanuel Kant, ao sustentar que “o homem está condenado a nunca se libertar das paixões políticas ou religiosas”.
Tribuna da Bahia