Equipe que atua na transição do presidente eleito prevê rombo na casa dos R$ 175 bilhões para bancar programas sociais
Recessão global, inflação e juros altos são somente alguns dos entraves que prometem assolar a economia mundial em 2023. Na contramão do movimento, a equipe do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva ignora os sinais adversos e defende um rombo nas contas públicas, cenário que tende a atrapalhar a vida dos mais pobres.
O temor apresentado nos últimos dias por economistas e analistas financeiros envolve a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) apresentada pela equipe de transição, que prevê um gasto de R$ 175 bilhões fora do Orçamento, fruto de uma despesa permanente para o pagamento de benefícios sociais fora do teto de gastos.
Carlos Eduardo de Freitas, ex-diretor do BC (Banco Central) e consultor econômico independente, explica que o principal problema atrelado ao aumento dos gastos envolve a possibilidade de estagnação do PIB (Produto Interno Bruto), o que ele classifica como a “origem da miséria” e classifica os auxílios financeiros como “apenas um remédio” para atenuar a pobreza.
“As soluções para os problemas de fome residem no crescimento econômico. […] Os investimentos e a criação de oportunidades de emprego são a cura da doença, o que exige um equilíbrio fiscal”, afirma Freitas ao citar que está “surpreso com a largada” para o terceiro mandato de Lula.
Para Rachel de Sá, chefe de economia da Rico, as sinalizações fazem com que os investidores visualizem maiores riscos de financiar o Brasil. “Esse aumento de percepção de risco se traduz na desvalorização de ativos brasileiros, como títulos do governo e de empresas, ações e a nossa própria moeda”, afirma.
As percepções citadas são a origem de mais inflação e podem aumentar ainda mais a taxa básica de juros da economia, atualmente em 13,75% ao ano. Na última reunião, ao optar pela manutenção da Selic no maior patamar desde o início de 2017, o BC (Banco Central) garantiu que se manterá “vigilante” contra o aumento dos preços.
“O Comitê enfatiza que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados e não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso o processo de desinflação não transcorra como esperado”, destaca a ata do Copom (Comitê de Política Monetária).
Crítica de apoiadores
Diante do cenário assustador, os economistas Arminio Fraga, Edmar Bacha e Pedro Malan, que apoiaram a candidatura de Lula, se manifestaram contra as recentes sinalizações da equipe de transição.
No alerta, os Pais do Plano Real rebatem críticas do petista ao teto de gastos e ao mercado financeiro. Para eles, a falta de responsabilidade com as contas públicas afeta, principalmente, os mais pobres.
A manifestação surge após Lula defender, durante participação na COP 27 (Conferência sobre Mudanças Climáticas das Nações Unidas) que “não vale a pena recuperar” o Brasil se “não resolvermos os problemas sociais”.
“Para cumprir o teto de gastos, geralmente é preciso desmontar políticas sociais e não se mexe com o mercado financeiro. Vai aumentar o dólar e cair a Bolsa? Paciência. Mas o dólar não aumenta ou a Bolsa cai por causa das pessoas sérias, e sim dos especuladores”, afirmou o presidente eleito.
Crise global
A elevação dos gastos públicos ganha ainda mais perversidade com o atual cenário econômico global. De acordo com o FMI (Fundo Monetário Internacional), perspectiva econômica mundial é “sombria” diante do ambiente marcado pelo aperto da política monetária para conter a inflação, o fraco impulso de crescimento chinês e a guerra na Ucrânia.
Freitas, ex-diretor do BC, avalia que o cenário da economia mundial para o restante da década “não é muito sorridente” e isso pode piorar ainda mais a situação do Brasil diante do aumento dos gastos públicos.
“Se o governo Brasil colocar uma aposta de aumento da dívida pública, vai precisar de mais dinheiro, porque o gasto maior rouba empréstimos do setor privado. Isso atrasa o investimento e, consequentemente, o crescimento econômico”, observa.
Diante do ambiente adverso, Freitas não descarta a possibilidade de o Brasil surfar na direção oposta das grandes economias, se adotar a responsabilidade fiscal. “O cenário mundial desfavorável não quer dizer que o Brasil não vai crescer, mas é preciso fazer o melhor possível para garantir um equilíbrio macroeconômico”, completa ele.
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