Pedro Poncio revela detalhes de bastidores que envolvem chantagem, medo e exploração de pessoas em vulnerabilidade
O teólogo Pedro Poncio, 30 anos, lembra-se da infância difícil que passou em Campo Grande (MS). A pobreza levou o seu pai, também chamado Pedro, a depositar esperanças no Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), que lhes prometeu uma vida melhor. A realidade, contudo, mostrou-se diferente.
Durante os seis anos em que esteve no MST, Poncio e seus dois irmãos mais velhos passaram por uma experiência sombria que hoje os credencia a criticar o grupo. “Nas escolas dos sem-terrinhas, éramos obrigados a cultuar Paulo Freire e Che Guevara”, contou ele, que hoje se manifesta contra o movimento.
Atualmente morando em Anápolis (GO) e fora do MST, Poncio afirma que o movimento promove uma lavagem cerebral nas pessoas. Quando conseguiu sair de tudo aquilo, ele “conheceu o mundo de verdade”. “Antes, parecia que vivíamos em uma caverna de Platão”, observou. À Revista Oeste, Poncio revelou bastidores de como funciona um acampamento do MST e o modus operandi de exploração do movimento que garante lutar pela reforma agrária.
A seguir, os principais trechos da entrevista.
— A relação do senhor com o MST inicia-se quando?
Em 2004, minha família estava em Campo Grande (MS), em situação de pobreza. Um amigo dos meus pais disse a eles que poderíamos melhorar de vida, se participássemos do MST. Decidimos ir ao local, que ficava perto do lixão da capital. As pessoas habitavam em uma espécie de “cidade de lona”. Fomos convencidos a permanecer naquilo. O primeiro comando foi: “Vocês precisam armar uma barraca igual à nossa, como forma de protesto”. Na sequência, soubemos que, em breve, passaríamos por um “treinamento de capacitação para ocupar terras”. Isso porque, em três meses, conseguiríamos um local exclusivamente nosso, segundo os dirigentes do MST. As primeiras semanas foram de adaptação. Erguemos a moradia improvisada, fizemos um fogão a lenha e me enturmei com as outras crianças. Com o passar do tempo, fui percebendo que nada mudava. A maioria da nossa subsistência vinha dali mesmo, aumentando cada vez mais a dependência que tínhamos do MST.
— Como é um acampamento do MST?
Organizado. Há quatro setores: educação, cultura, segurança e agricultura. Em praticamente todos os acampamentos, funciona dessa maneira. Quando uma família se torna parte do MST, ela é obrigada a participar de um desses núcleos. Meu pai, por exemplo, era da segurança. Nessa área, os homens aprendem a cortar árvores, permanecer em guaritas ao redor do acampamento e cuidar de todos os membros. Quando há “inimigos” ao redor, usam-se fogos de artifício para alertar a todos, que pegam qualquer coisa para se defender. Por ser criança, fui para a cultura, conhecida como “escola dos sem-terrinha”, onde aprendi que o agronegócio e o capitalismo são ruins. Lembro-me de uma “manifestação artística” a que tivemos de assistir. Um homem fantasiou-se de “agro” e outra pessoa vinha com uma “seringa” gigante com o adesivo “agrotóxico”. Ao ser “injetado” com aquele objeto, o personagem agia de forma violenta e dizia ser um “monstro”. Aprendíamos ainda coisas boas sobre o ditador Fidel Castro e o guerrilheiro Che Guevara. O ensino tradicional, como português e matemática, ficava em segundo plano, isso quando tinha algo a respeito para nos ensinar. Era um ambiente completamente esquizofrênico.
— Depois de passar por esse setor da cultura, qual era o próximo passo?
Levavam-nos a manifestações. Conforme você vai crescendo, pode-se “subir de nível”, como participar de uma invasão. Fiz parte de várias marchas que iam do acampamento até a sede do Incra, no centro de Campo Grande. Já houve momentos em que batíamos em carros que buzinavam em protesto contra a gente e até depredamos patrimônio público, quando a temperatura subia.
— Como as ordens eram dadas?
Os “peixes grandes” eram viajantes, que volta e meia apareciam com “comandos lá de cima”. Eles traziam notícias do que havia sido decidido pela “cúpula”, que nunca era identificada. O único do alto comando cujo nome sabíamos era João Pedro Stédile. Para ter ideia do poder desse pessoal, até mesmo as manifestações só ocorriam se “os lá de cima” mandassem. Parecíamos um exército vermelho da antiga União Soviética.
— A sua família conseguiu ter uma terra?
Sim. Recebemos uma porção de terra na Fazenda Eldorado, em Sidrolândia, cidade próxima da capital. O local pertencia a um homem que simpatizava com a causa, de acordo com os peixes grandes do MST. Apesar de ter conseguido algo nosso, moramos na lona por um bom tempo, porque não havia dinheiro para construir a casa. Meu pai dedicou boa parte do tempo dele ao movimento. Aliás, isso ocorre com frequência no MST. A maioria dedica anos de “luta” e, quando consegue a sua terra a muito custo, não tem forças para produzir nela ou edificar um lar. Ainda sobre a nossa casa, os materiais vinham do próprio MST, mas demoravam a chegar e vinham aos poucos. Soubemos que bastante matéria-prima, de boa qualidade, ficou com os dirigentes do MST. Os militantes do núcleo duro eram mais favorecidos que os assentados. A impressão que tínhamos era que haviam nos abandonado.
— Por que o senhor saiu do MST?
Aos 18 anos, sai do assentamento por falta de oportunidades. Consegui um trabalho em Dourados, uma cidade perto dali, para conseguir ajudar os meus pais. Ao chegar à nova vida, deparei com uma realidade totalmente diferente. Cursei o último ano do ensino médio por lá. Descobri o Enem, porque nem isso era ensinado para nós no assentamento. O mínimo que se espera de alguém que se diz educador é que faça de você alguém interessado em crescer e ter acesso ao conhecimento.
— O senhor e sua família já receberam ameaças, desde a exposição nas redes sociais?
Sim. Meus pais receberam ligações de militantes, em tom de ameaça. “Estamos de olho em vocês”, disse uma voz, certa vez. Certa vez, os militantes submeteram o meu pai a uma situação vexatório, ao o obrigarem a tirar uma foto segurando um carta do ex-presidente Lula, apesar de não apoiar o petista. Quanto a mim, já recebi uma série de mensagens com tom de ameaça. O que faço é bloquear tudo e seguir a vida.
— Como o senhor resumiria o MST?
Um grupo revolucionário e terrorista que usa pessoas em vulnerabilidade social para um projeto político de poder. O MST é um movimento ilegal. Enquanto se está dentro dele, vive-se uma realidade paralela. Parece uma caverna de Platão. Ali, há gente boa. Nem todos são de má índole. De toda forma, o grupo tem de ser criminalizado, para não continuar instrumentalizando as pessoas.
— Com a vitória de Lula, o MST vai voltar a aterrorizar o campo? Pode-se dizer que as invasões aumentarão?
Sim. Lula já disse que o movimento voltará a ter protagonismo em seu governo. Além disso, o petista prometeu revogar decretos sobre o armamento, dificultando o direito à defesa da propriedade. Soma-se a isso a decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, de criar uma comissão para “humanizar” a desapropriação de propriedade, inviabilizando o processo de retirada dos sem-terra de uma fazenda invadida.
REVISTA OESTE