Em discurso na segunda plenária da Cúpula das Américas, nesta sexta-feira (10), o presidente Jair Bolsonaro (PL) buscou responder a críticas que o governo vem sofrendo por sua atuação nos esforços para encontrar o jornalista britânico Dom Philips, 57, e o indigenista Bruno Pereira, 41, desaparecidos na Amazônia desde domingo (5).
“Desde o último domingo, quando tivemos a informação de que dois cidadãos, um britânico, Dom Phillips, e o brasileiro Bruno Araújo [Pereira], desapareceram na região do Vale do Javari, as nossas Forças Armadas e a Polícia Federal têm se destacado na busca incansável para alcançar essas pessoas. Pedimos a Deus que sejam encontrados com vida”, afirmou, em pronunciamento em Los Angeles.
Durante a semana, o governo foi criticado pela falta de uma força-tarefa dedicada às operações de busca. Entidades como o Alto Comissariado para Direitos Humanos da ONU, a embaixada do Reino Unido e entidades da sociedade civil brasileira fizeram cobranças, e nesta sexta o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, ordenou que a União adote “todas as providências necessárias […] utilizando-se de todos os meios e forças cabíveis”.
Na quinta, em Los Angeles, o ministro da Justiça, Anderson Torres, tratou do caso com representantes de Reino Unido e EUA. Ele teve uma reunião com Vicky Ford, subsecretária de América Latina da chancelaria britânica, que pediu que o governo faça de tudo para encontrar Dom e Bruno. O ministro disse que ao menos R$ 500 mil já foram gastos na investigação e nas buscas.
A região do Vale do Javari frequentemente é alvo de invasões de garimpeiros ilegais. O indigenista e o jornalista desaparecerem no domingo (5), quando iam rumo a Atalaia do Norte (AM). Bolsonaro já havia minimizado o episódio, dizendo que os dois estavam numa “aventura não recomendada”. Phillips estava realizando uma cobertura jornalística e contava com o apoio de Pereira.
O presidente citou o caso na parte final de sua fala na plenária da Cúpula das Américas, quando passou a ler observações em papéis sobre o púlpito. Os chefes de Estado são livres para abordar os temas que queiram destacar no evento, que reúne mais de 30 delegações dos países do continente.
Ao longo dos cerca de dez minutos de discurso, Bolsonaro priorizou temas ambientais. Falou do investimento em energias limpas —tema caro à pauta da cúpula proposta por Biden— e repisou a alegação de que o Brasil “é um dos países que mais preserva o meio ambiente”, a exemplo do que fez em outros pronunciamentos em fóruns internacionais. Sua gestão é alvo de críticas frequentes, inclusive de autoridades americanas, por causa dos aumentos nos índices de desmatamento.
O presidente destacou ainda que o país pode aumentar a produção do agronegócio sem precisar do território amazônico e que é capaz de produzir grandes quantidades de comida.
“O Brasil alimenta 1 bilhão de pessoas. Garantimos a segurança alimentar de um sexto da população mundial. Sem o nosso agronegócio, parte do mundo passaria fome”, afirmou. Bolsonaro ignorou dados que indicam que a insegurança alimentar no próprio Brasil tem crescido. Um estudo do Ipea, órgão ligado ao governo federal, divulgado nesta quarta (8) apontou que ao menos 33 milhões de brasileiros sofrem com a falta de comida.
O mandatário ainda usou seu discurso para elogiar o encontro bilateral que teve com Joe Biden nesta quinta —ele já havia feito comentários nesse sentido a jornalistas ao menos duas vezes. “Ficamos por 30 minutos sentados, numa distância inferior a um metro e sem máscara”, ressaltou. Os demais integrantes das comitivas estavam com o item de proteção, num protocolo de praxe adotado pelos EUA.
“Senti em Biden sinceridade e vontade para resolver problemas que fogem da responsabilidade de cada um de nós. A experiência foi fantástica. Estou maravilhado e acreditando em suas palavras e naquilo que foi tratado.” Diplomatas já tinham se mostrado, em conversas reservadas, surpresos com os resultados do encontro, dizendo que “houve química” entre os líderes de EUA e Brasil, de forma a pôr um ponto final na crise entre os mandatários, que nunca haviam se falado.
Bolsonaro disse ainda que o Brasil se engajou nas negociações dos temas da cúpula e defendeu mais integração regional. “Vamos trabalhar juntos para que essas propostas conduzam a uma nova agenda de cooperação para o crescimento econômico nas Américas.”
No discurso, mencionou avanços em parcerias locais, como projetos de piscicultura no lago de Itaipu, com o Paraguai, e de exploração de gás na região argentina de Vaca Muerta. O brasileiro também citou o avanço da exploração de petróleo na Guiana e no Suriname, países que visitou recentemente. Ele havia indicado que falaria de improviso sobre esses temas.
A fala do brasileiro também teve mensagens direcionadas ao setor mais conservador e ao público interno, mirando a eleição presidencial de outubro. Bolsonaro disse que a liberdade é um valor “mais importante que a vida” e que seu governo “acredita em Deus, respeita seus militares e é favorável à vida desde a sua concepção”.
Ainda nesta sexta, o líder brasileiro tem encontros com os presidentes Iván Duque (Colômbia) e Guillermo Lasso (Equador). Na sequência, deve participar da “foto de família” com todos os chefes de Estado, antes de embarcar para Orlando —na cidade, vai inaugurar um vice-consulado e encontrar apoiadores neste sábado (11).
Neste último dia de Cúpula das Américas, a expectativa recai sobre a assinatura de uma declaração sobre imigração, proposta pelos anfitriões, com medidas para tentar conter o fluxo de cidadãos latino-americanos que tentam entrar nos EUA de modo irregular.
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